Ontem, chorei.
Cheguei a casa, meti-me no quarto, sentei-me na beirinha da minha
cama, tirei os sapatos, desapertei o sutiã
e chorei um bom bocado.
Acreditem
que chorei até o meu nariz pingar para cima da minha blusa de seda
que comprei nos saldos.
Chorei até ficar com as orelhas quentes.
Chorei até ficar com uma dor de cabeça tão grande,
que mal conseguia ver a pilha de lenços de papel sujos acumulada
no chão, aos meus pés.
Quero que saibam
que ontem chorei um bom bocado.
Ontem, chorei
por todos os dias em que estive tão ocupada, ou tão cansada, ou
tão irritada, que nem consegui chorar.
Chorei por todos os dias, e de todas as maneiras
e todos os momentos em que eu desonrara, desrespeitara e desligara
o meu Eu de mim própria,
e acabara por vê-lo reflectido na maneira como
os outros me faziam
as mesmas coisas que eu já fizera a mim própria.
Chorei por todas as coisas que eu dera para depois mas roubarem;
por todas as coisas que pedira e ainda não se tinha concretizado;
por todas as coisas que conquistara para depois as dar a pessoas
em circunstâncias
que me deixavam com uma sensação de vazio, magoada
e simplesmente usada.
Chorei, porque realmente chega uma altura na vida em que
a única coisa que nos resta fazer é chorar.
Ontem, chorei.
Chorei pelos meninos abandonados pelos pais;
e pelas meninas esquecidas pela mães;
e pelos pais que não sabem o que fazer e, por isso, partem;
e pelas mães sem marido que, por isso, enlouquecem.
Chorei, porque tive um menino quando eu própria era uma menina
e porque eu era mãe e não sabia o que fazer,
e porque queria o meu pai ao meu lado, queria-o
com tanta força que até doía.
Ontem, chorei.
Chorei, porque sofria.
Chorei, porque me fizeram sofrer.
Chorei, porque o sofrimento não tem para onde ir,
a não ser para dentro da dor que o causou à partida,
e quando lá chega, o sofrimento desperta-nos.
Chorei, porque era demasiado tarde.
Chorei, porque era chegada a minha hora.
Chorei, porque a minha alma sabia que eu não sabia
que a minha alma sabia tudo o que eu precisava de saber.
Chorei com toda a alma, ontem, e soube-me tão bem.
Pareceu-me tão, tão mal.
Por entre o meu choro, senti a minha liberdade chegar.
Porque
ontem, chorei com um objectivo.
de Iyanla Vanzant