quinta-feira, julho 31, 2008

Folheto

Sou o comprimido calmante.

Actuo em casa,

sou eficaz na repartição,

sento-me no exame,

apresento-me em tribunal,

colo minuciosamente a louça partida.

Basta que me tomes,

que me ponhas debaixo da língua,

que me engulas

com um copo de água.

Sei o que fazer na desgraça,

como aguentar a má notícia,

diminuir a injustiça,

desanuviar a falta de Deus,

escolher o chapéu de luto a condizer.

Por que esperas?

Confia na piedade química.

Ainda és jovem,

tens que te governar.

Quem disse

que se deve enfrentar a vida?

Entrega-me o teu abismo,

vou aconchegá-lo com o sono,

ser-me-ás grato,

darás a volta por cima.

Vende-me a tua alma.

Não haverá melhor comprador.

Outro diabo já não existe.

Poema de Wislawa Szymborska

em Alguns gostam de poesia


1 comentário:

miak disse...

Genial.