sexta-feira, setembro 29, 2006

Três sonetos de Deus ausente

1.
Gostava tanto que Deus existisse!
Como eu havia de ser diferente,
pior ou melhor não sei, se o visse
caminhando, humano, entre a gente

que vai prò trabalho de madrugada,
tão pobre, suburbana, gente triste
como ela só, e tão desamparada,
que sofre, sofre tanto, mas resiste,

e regressa a casa noite fechada,
sem tempo para os filhos, o amor,
nada, nada, semana após semana,

gente humilhada, gente perseguida.
E Deus ausente, seja onde for,
todo o mês, todo o ano, toda a vida.

2.
Gostava tanto que Deus existisse!
Como eu havia de ser diferente,
pior ou melhor não sei, se o visse,
na manhã de neblina persistente,

a apanhar conchinhas brancas na praia,
como quem apanha nuvens no céu.
Seria menina e teria a saia
azul, curta, talvez de chita; eu
procuraria ajudá-la a encontrar
a conchinha mais bonita, depois
de ver a espuma das ondas e o ar
a bailar como grandes bailarinos.
E seríamos felizes os dois,
pois ficaríamos sempre meninos.

3.
Porque Deus, se existisse, era o azul
mais azul, a infância que não acaba.
Era pai, colo, primavera, mil
vezes o raiar da mesma madrugada.

E no desespero de um fim de tarde,
haveria de aspergir sobre nós
o seu olhar de infinita bondade,
o calor do gesto, o cristal da voz.

Tudo, tudo, outra vez seria novo,
eterno mesmo só por um minuto:
água de lume mais rosa do povo,

voz, viagem, Penélope, Ulisses,
som de piano, flauta, flor e fruto.
Gostava tanto que Tu existisses!

Poema de, José Carlos de Vasconcelos
em, Repórter do Coração


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Eu, costumo dizer, se acreditasse em Deus passaria muito de meu tempo em igrejas, capelas, capelinhas e santuários!

Mas não a Lhe rezar, e sim a ralhar com Ele!

Este poema, eu acho lindo.

Espero que agrade a mais alguém. Um beijo e bom fim de semana, para todos.

fatima





5 comentários:

Klatuu o embuçado disse...

Ai, ai... :)

Deepak Gopi disse...

poetry ....

aqui-há-gato disse...

Primeiro, parabéns pelo blog.

Ralha tb por mim:)
Sabes q sinto o q sentes!

Anónimo disse...

Deus existe porque a morte é a única certeza concreta do ser humano, qual é a forma de nos confortarmos perante tal facto?Idealizar crenças, ter fé num salvador que nos absolvirá da morte, dando-nos a vida eterna no paraíso com aves exóticas.Infelizmente isto é tudo muito falso, a religião está a desmoronar e nós? Ficamos a viver para morte, esforçamo-nos apenas para surpreender alguém e acabar numa vidinha tradiconal igualmente falsa? Não, não quero isso para mim. E o suícidio, opção ou tentanção? Não sei, mas sou cobarde e não sou egoísta...Só sei que a religião, Deus, e o conjunto transcendente, é sobretudo um obra dos homens, prova que temos capacidade para manipular a nossa condição, a morte!!
Gostei deste blog, cheira a remédio de morango, antibiótico infantil, sabe bem para alguns!. Continua.

Ana Luar disse...

Deus...
Por vezes preciso acreditar nele...
tantas outras revolto-me e grito com ele... explico-lhe que ele pode ser omnipotente mas não é melhor que a gente... fica impávido e sereno perante a injustiça... tenho que ficar fula.